Gastronomia
Giovannetti Rosário reedita o clássico de boteco Bolovo
Salgado integra o novo cardápio do bar, que completa 80 anos em maio
Bons pratos normalmente são guarnecidos por saborosos causos ou fábulas. Uma bem-humorada alegoria dá conta de que o Bolovo, um clássico da culinária de boteco, foi criado no Brasil depois de um acidente entre três caminhões, que carregavam respectivamente ovos cozidos, farinha de trigo e carne moída. A bagunça provocada pela mistura dos produtos derramados na pista teria inspirado uma cozinheira a produzir o famoso salgado. Ficção à parte, no ano em que completa o octogésimo aniversário, o Giovannetti Rosário reedita, em Campinas, o tradicional quitute, que fez parte do cardápio da casa no início das suas atividades, nos idos da década de 30.
A bem da verdade, há variações do Bolovo em outros países, que reclamam a criação do pitéu. Na Escócia, por exemplo, existe o scotch egg, primo-irmão do nosso salgado, que leva carne suína no preparo. No Giovannetti, o quitute merece cuidados especiais. Ele é feito por uma equipe de profissionais que somam mais de 30 anos de casa. Sem essa experiência, não seria possível chegar ao resultado desejado, que transformou o bolinho em uma prazerosa experiência sensorial.
Uma dos segredos da preparação do Bolovo do Giovannetti é o tempo dedicado à cocção dos ovos. Eles devem cozinhar por precisos seis minutos. Em seguida, são retirados e transferidos para uma vasilha com água gelada, de modo a cortar o cozimento. Esse processo garante que a clara fique cozida, mas que a gema permaneça cremosa. Depois de descascados, os ovos são envoltos por uma camada de carne moída, previamente temperada com especiarias, sal e um toque de farinha de rosca feita com pão italiano.
De acordo com o chef Diogo Silveira, que desenvolveu este e outras receitas para o Giovannetti, a camada de carne deve ter no máximo 1 cm de espessura, para que não fique desproporcional em relação ao ovo. “O último passo é levar o Bolovo à fritadeira, por somente dois minutos. Isso vai garantir que a carne fique crocante por fora, macia por dentro e que a gema continue cremosa”, ensina o cozinheiro, para quem o salgado é um símbolo da culinária de boteco. “Trata-se de uma criação tão incrível, que ganhou novas versões e passou a fazer parte do cardápio de muitos chefs estrelados”, lembra Silveira.
Trajetória do chef
Quando menino, o goiano Diogo Silveira tinha o Cerrado como quintal e a cozinha da fazenda dos avós como um de seus recantos favoritos. Tinha também um desejo: tornar-se dentista quando crescesse. Anos depois, uma viagem à Irlanda fez com que o jovem Diogo desistisse de se dedicar à odontologia e passasse se entregar às panelas, temperos e alquimias. Começava ali uma trajetória que resultaria numa carreira recheada de experiências e sucessos. O hoje chef Diogo Silveira comanda quatro restaurantes e dois bares na cidade de São Paulo, entre eles o destacado MoDi Gastronomia.
O conceito que orientou o trabalho para o bar Giovannetti, segundo ele, foi o resgate, por meio de releituras atuais, de receitas que remetem à origem da casa. “Também quisemos reavivar a cultura de boteco, que nos brinda com inúmeras criações deliciosas”, afirma.
A consultoria desenvolvida para a casa, assinala o chef, foi muito prazerosa e extrapolou a elaboração de pratos. O trabalho envolveu extensa pesquisa histórica, treinamento de pessoal e uma boa dose de entrega emocional. “Sou um admirador da cozinha afetiva, aquela que promove a reunião de pessoas em torno da mesa e que é desprovida de gourmetização. É o tipo de comida que remete à minha infância, período em que eu ficava na cozinha acompanhado meu pai e minha avó preparando as maravilhosas iguarias da culinária goiana”, conta.
Nessa linha, continua Diogo, reeditar o Bolovo, ou criar, por exemplo, uma receita de ravióli de nata, que reaviva esta gordura muito utilizada pelos nossos avós, de almôndegas com polenta, de ossobuco, dentre outras, representa um compromisso com a valorização da culinária de raiz, fundada principalmente no uso de produtos naturais e frescos, postura classificada na atualidade como “cozinha de ingredientes”. “Obviamente, tudo isso também está intimamente relacionado com a história do Giovannetti, que nasceu no interior paulista e cujos fundadores e administradores são respectivamente de origem italiana e portuguesa”, observa.
A ligação de Diogo Silveira com a cozinha, iniciada na infância, começou a ganhar contornos profissionais quando ele deixou o Brasil em direção à Irlanda, em 1999, país no qual passou boa temporada. Lá, a primeira oportunidade de trabalho foi oferecida por um restaurante. A função do garoto nascido em Anápolis ainda não era pilotar o fogão, mas sim lavar panelas e ajudar a picar batatas. A convivência naquele ambiente, porém, fez com que Diogo tivesse sua atenção despertada para a atividade de cozinheiro.
Na Irlanda, logo percebeu Diogo, o chef de cozinha era respeitado e bem remunerado, ao contrário do que ocorria no Brasil. “Além disso, os cozinheiros dispunham de equipamentos ultramodernos, como termociruladores, que só chegariam por aqui muitos anos depois. Entretanto, o que mais me conquistou foi ter convivido em ambientes com dezenas de anos de história na gastronomia. Restaurantes onde o amor pela cozinha era passado de geração para geração. Ao vivenciar tudo aquilo, pensei: ‘é isso que quero para minha vida’”, rememora.
Da Irlanda, Diogo partiu para viver experiências em outros países, como Inglaterra, França, Itália e Uruguai. O período mais marcante, porém, ocorreu em São Francisco, nos Estados Unidos, onde permaneceu por três produtivos anos. “Foi uma fase incrível. Trabalhei em vários ótimos restaurantes. Nenhum ostentava estrelas Michelin, mas a maioria praticava uma gastronomia comprometida com as melhores tradições da culinária que representava”, relata.
Após todas essas andanças, Diogo finalmente retornou ao Brasil, decidido a montar um restaurante no qual pudesse aplicar tudo o que aprendera no exterior. Passou primeiramente por Brasília, onde conheceu a chef Ana Soares, de São Paulo. Decorrido algum tempo, aportou na capital paulista. Inicialmente, ajudou na concretização do projeto de um wine bar. Durante esse trabalho, conheceu um dos sócios do restaurante Pomodori, do qual foi posteriormente funcionário e, em seguida, sócio proprietário.
Com o final da sociedade no Pomodori, Diogo decidiu tirar um ano sabático na Europa. Retornou renovado e, baseado nas observações que fez, comprometido com a criação de um restaurante que aliasse boa técnica, ingredientes de qualidade e preço acessível. As premissas foram concretizadas no MoDi Gastronomia, um dos mais prestigiados restaurantes de São Paulo, que hoje conta com quatro unidades. O chef também comanda o bar Lambe-Lambe, outro espaço que promove a tão necessária união entre boa comida e preço amigável.
Serviço
Giovannetti Rosário
Rua General Osório, 1059, Centro, Campinas, SP
Telefone: (19) 3231.2830
Horário de funcionamento: todos os dias das 08h até o último cliente
www.giovannetti.com.br
Twitter | Instagram: @giovannetticps
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